"O ensino de nossa língua materna!"
O ensino e a aprendizagem de língua materna podem ter um
grande impulso com as contribuições da filologia. Neste caso, o filólogo apresenta as questões sócio histórico culturais que permeiam a história de qualquer língua e isso não seria diferente com a língua
Materna em solo brasileiro, ou seja, a portuguesa. O estudo da língua
Portuguesa e de suas especificidades passa pela diacronia. Muitos fenômenos só são explicados na sincronia através dos fatos que marcaram a sua história, sejam aqueles ocorridos nos níveis fonético, morfológico, sintático ou lexical. Tomar-se-á aqui a formação do léxico da língua portuguesa para enfatizar a importância do conhecimento diacrônico e para tal foram elencados alguns exemplos, apresentados a seguir. Faz-se relevante salientar que a formação do léxico de uma língua de cultura perpassa justamente pelas questões sócio histórico culturais
já mencionadas, pois, como assinalam Oliveira e Isquerdo
(1998, p. 7), “[...] O léxico de uma língua conserva uma estreita.
relação com a história cultural da comunidade.” [...] “na medida em que o léxico recorta realidades de mundo, define, também, fatos de cultura.”.
Lüdtke (1974), ao se referir à história do léxico românico, afirma.
que todas as mudanças no vocabulário estão relacionadas, de alguma forma, com as mudanças políticas e culturais. Sendo assim,
não se pode dissociar a formação do léxico da língua portuguesa com
a história e a cultura do povo que a fala.
Origem do vocábulo “cavalo”:A língua latina, a qual foi fragmentada por diversos processos resultou na formação das línguas românicas, dentre estas a portuguesa, que possuía em seu léxico a forma equus, que designava o animal
de batalha, militar, de esporte. A língua latina popular apresentava a
forma caballus, da qual foram originadas as formas nas línguas românicas,sendo em português cavalo. No entanto, os adjetivos relativos a cavalo foram formados a partir de equus: em português equestre,
equino, equitação.
Orelha e seus derivados
A palavra orelha em latim era auris, que foi substituída na
língua popular pela forma derivada auricula. Esta, por sua vez, passou por processos naturais de simplificação, tais como: redução do ditongo au a o; síncope da vogal u; resultando em oricla, que por sua vez teve o grupo formado pela consoante oclusiva mais líquida, cl,palatalizado e por processo de harmonia vocálica a vogal medial i
passou a e. A tradução desses processos é a forma portuguesa orelha.Contudo, as formas adjetivas relativas a orelha seguem auris,auricula:auricular.
Leite e seus derivados
A palavra latina que designava o leite era lacte. Esta, em sua
passagem do latim para o português, teve o primeiro elemento do
grupo formado por consoantes oclusivas ct se palatalizar, ou seja,
passar a i, por harmonia vocálica a passou a e, ficando então leite.
Entretanto, as formas derivadas se mantêm fiéis a lacte: lactante, lácteo,laticínio.
Palavras de origem indígena e africana
A língua portuguesa que hoje se fala no Brasil foi para cá trazida
pelos portugueses quando do processo de colonização das terras
da América do Sul. Quando aqui chegaram os portugueses, estes encontraram uma diversidade étnica formada pelas inúmeras tribos que aqui habitavam. Para que houvesse comunicação entre portugueses e indígenas, aqueles foram aprendendo os dialetos e idiomas destes. A língua tupinambá era a usada pelos grupos indígenas que se mostraram mais abertos ao contato com os portugueses, sendo daí criada a língua geral e daquela partiu a primeira influência recebida pela língua dos colonizadores.
Outro contato importante ocorrido em solo brasileiro e que influenciou a língua portuguesa foi aquele proveniente das línguas dos negros africanos para cá trazidos como escravos. Estes aprenderam português para se comunicarem com os senhores e com isso deixaram as suas marcas linguísticas na língua portuguesa.
São de origem indígena, ou mais precisamente da língua tupinambá,
nomes de plantas, frutas e animais brasileiros, tais como: abacaxi,
jabuticaba, maracujá, buriti, caatinga, carnaúba, cipó, ipê, sucuri,
piranha, dentre outros. Além deste, a toponímia revela também
esta influência: Aracaju, Caraguatatuba, Jabaquara, Parati, Piracicaba,Itaberaba, Itapuã etc.
As influências das línguas africanas são confirmadas através
da culinária afro-brasileira, das religiões afro-brasileiras, do vocabulário familiar, do universo das plantações de cana, dentre outros. Podem-se elencar as seguintes palavras: maxixe, abará, acarajé, vatapá,
orixá, Exu, Oxossi, Oxum, Iansã, senzala, molambo, caçula, cafuné,
moleque, banguê, samba etc.
O ensino e o aprendizado de uma língua estrangeira também
perpassam pelo conhecimento do vocabulário da língua materna e as
possíveis correspondências que se pode encontrar na língua alvo.
Neste sentido, dá-se ênfase à história da língua, pois o entendimento
desta representa uma importante chave de acesso a outros links. As
tendências atuais em ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras
destacam as interfaces sócio culturais.
Conhecer bem a língua materna, saber como funcionam suas
partes integrantes, pode auxiliar e muito o ensino e o aprendizado de
outra língua. Sendo esta da mesma família linguística que aquela,
faz-se ainda mais significante. Entretanto, esta não é uma condição
sine qua non. Todo este conhecimento pode ser muito válido quando
se estuda inglês, ou alemão, por exemplo. Segundo Berlitz (1988, p.
222): “Embora milhares de línguas e dialetos sejam falados hoje, a
maioria dos povos fala ou reconhece palavras básicas em 25 línguas
principais.”
Enviado por Maria Augusta da Silva Caliari em 10/01/2013
Alterado em 27/04/2019